Como se ser assim nos intermeios? Nas entrelinhas e nos dizeres que não são nossos. O que almejar quando tudo parece plano e nada no horizonte vem para se alcançar? O que perder quando não se tem nada para ganhar? Estamos na beira da estrada. Seguimos sempre sem olhar para trás. Vamos indo, correndo aflitos parece para chegar ao fundo, mais longe, ao km seguinte, ao novo restaurante para o qual na realidade não se tem dinheiro. Vamos seguindo numa maratona que bloqueia o cérebro do pensar. Que o desativa lentamente, como que lhe dando um tónico forte que inebria. Mas mesmo assim, com as pernas bambas, cansados, vamos seguindo na beira da estrada. Há uns que passam mais apressados ainda, outros que vão em carros de alta cilindrada. Outros que estão parados. Sem sabermos porquê. Vamos os dois então. Anda comigo e faz-me correr livre, feliz por estar apenas a correr. Vem e corre comigo só por correr.
quinta-feira, 15 de maio de 2014
segunda-feira, 5 de maio de 2014
Impressão de Fuga
Ando para
trás e para a frente na vertigem do que está para ser. Penso no que seria. Tento
entender que a vida é isto também. Vivo aqui nesta contingência de horas que
medeiam os fins-de-semana. Sacos de tempo insuflados, vazios mas grandes a
flutuar no tempo, ocupando das 9h às 9h numa cadeia sucessiva de tempos,
momentos e sacos, muitos sacos, sem lógica. Uma cacofonia de sacos e tempos que
não consigo entender. Não consigo. Queria ir para conhecer, queria acordar para
ser. Queria estar para ajudar e fazer para poder crescer. Vou crescendo é
certo. Amorfa? Resignada? Triste? Cinzenta? Almejo a ponta do sol que se
desponta por entre as persianas no quarto no início de mais um fim-de-semana.
Melodias de desassossego
Vim aqui hoje com a ideia de entreter o pensamento,
para que se desligasse do tempo que teima em não passar. Parece feito em câmara
lenta. Parece composto por segundos gordos, opacos, com arestas que dificultam,
que custam a escorrer pela estrada fora. Queria algo que me desviasse da
atenção que todos os dias tenho que fingir. De me não ser. E já não lembro do
último dia em que não olhei para o relógio. Avanço dois passos. Determinados.
Determinada. Depois uma voz monótona que me puxa de novo para a rotina e para o
desapego de mim. Esqueço-me numa fração de segundo do propósito do instante
anterior. Sucumbo e volto invariavelmente à estaca zero. Ainda assim, na minha
lembrança, visto-me de hibiscos brancos e sandálias douradas, rasas. Cabelos em
desalinho. E sigo para perto do meu desassossego.
Rosa Fragoso
De
noite converso em silêncio com a minha avó paterna que me fala das rosas
encarnadas que apregoava por Alfama há muitos anos atrás. Que me conta como, no
intervalo da escola, o meu pai gostava de papos-secos com marmelada, que ia
ganhando dos outros colegas em troca de umas tabuadas feitas em compasso de
corrida antes da campainha antes de mais uma aula. Como o cabelo dele era
encaracoladinho, assim como o meu.
O
seu nome é Rosa Fragoso. Tenho-a sempre para mim. Não tive hipótese de a
conhecer, mas de alguma forma sinto como se já tivéssemos sido apresentadas.
Pelas poucas fotografias talvez. Lembro-me em pequena de a olhar com curiosidade
e de me terem contado que era a minha avó paterna falecida há já muito tempo no
dia de natal, havia o meu pai 3 meses de idade. Hoje sinto que a levo comigo numa
medalhinha cor de latão invisível ao pescoço. Ainda que não tenha muita
informação sobre a sua vida, sem que foi daquelas pessoas que se sentiu
infeliz, mas também e essencialmente, feliz. Sei que viveu plena ainda que
pouco.
Por
vezes sinto o peso da responsabilidade dela nos meus ombros. De me realizar,
para a realizar a ela. Por um intento maior. Por uma necessidade inexplicável
de um amor que nunca tive hipótese de expressar. Sei que foi uma grande mulher,
pobre, condigna, alegre e ingénua, mas não por isso menos forte. Destemida e
meiga ao mesmo tempo. Eu queria realizar-te. Descobrir-me, para te deixar
orgulhosa de mim. Às vezes sinto-me um pouco como tua filha também.
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